sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Os becos de Custódia



Sabemos que todas as cidades tem suas curiosidades. Senão vejamos; Arcoverde tinha o trem a dividi-la ao meio, Caruaru, junto com a festa de São João, tem também a feira e Nova Jerusalem. Triunfo, tem o clima europeu com um frio de rachar, Serra Talhada, o corte em cima da serra, daí o seu nome, e por aí vai…


Mas ter becos igual a Custodia, não conheço uma cidade sequer. Vejam:

Beco de Pedro Rafael, Beco de Valentim, Beco de João Florêncio, Beco de Manoel Henrique, Beco de Pedro Mariano, Beco de João Prefeito, Beco de Zé de Noca, Beco de Luiz Amaral, Beco de Heleno Aleixo e o mais famoso e frequentado de todos:

O BECO DE ZUCA PINTO.

Este se sobressaía por três motivos:

1 – O humor de poucos amigos de “Seo” Zé Pereira (bisavô de Paulo Peterson) – Quem quisesse ser escarreirado era só fazer “ponto” na calçada do “Sêo” Zé.

2 – Bar e bodega de Zuca Pinto. No bar tinha sinuca e bilhares além do que, nos dias da feira era montado o “cassino” do Dedé Blandino. Com Roletas, Maior Ponto e Aliado, tudo jogo de Azar e ainda o jogo do bicho. A freqüência no Beco de “Sêo Zuca era o point da época às segundas feiras. Lembro bem que foi no bar de Zuca que Pedro de Da.Izaque acendeu uma bomba de São João tipo“PEIDO DE VÉIA” e jogou no bolso do paletó de um “matuto”que encostado na mesa de jogo e distraído, arriscava uma fezinha na roleta de Dedé. Mermão, esse “home” quando sentiu o “tiro da bomba” saiu numa disparada com o bolso do paletó pegando fogo, numa gritaria enlouquecida em direção à Farmácia Pereira (Pronto Socorro), aos gritos :

FUI BALEADO, ME BALEARAM, ME SOCORRA SÊO JOAQUIM, VALEI-ME DONA CORINA, MINHAS VISTAS JÁ ESTÃO ESCURECENDO. VOU MORRER.

Passado o susto, com o matuto mais calmo, Sêo Joaquim disse-lhe:
- Pois é rapaz. Se sangue FEDER, você está mesmo baleado.

No bar de Zuca, a forma para pagamento do uso da sinuca era os minutos marcados por um relógio de pêndulo, fixado na parede. A molecada inclinava o relógio, tirando-o do prumo. O relógio parava, e quando Zé Nogueira, o gerente do bar, via o relógio parado, já tínhamos jogado mais de hora.

3 – No beco de Zuca, aos domingos até meio dia, não tinha pra ninguém. A barbearia de Zé Nego ficava “entupida”. Parecia até que em Custódia só se cortava cabelo e fazia barba aos domingos, após a missa das sete é claro. Neguinho passava na barbearia, nem que fosse para jogar conversa fora e/ou ouvir as últimas.

Com Zé Nego, trabalhava outro barbeiro. Se não me engano o nome dele era Edílson. Ambos competentes no ofício da tesoura e da navalha (Solingen), alemã, que era afiada num pedaço de madeira leve tipo miolo de pé de milho. O Zé Nego monopolizava a clientela. Era o barbeiro preferido dos clientes. Trabalhava com mais calma, contava causos, era por assim dizer, um bom papo. Já o Edílson era mais despachado. Conversava pouco. Fechado, até.

Essa foi de lascar. Até porque o Edílson era um poço de ignorância quando contrariado.

Certa vez, num dia de feira, chegou um homem com um meninote na barbearia. Cortou o cabelo fez a barba com Edílson, e foi dizendo:
- O Sr. Por favor, corte o cabelo desse menino, que eu vou ali no açougue comprar uma carne, volto já, quando então farei o pagamento.

Ta bom. Edílson cortou o cabelo do menino, que voltou a sentar-se esperando o homem que fora comprar carne.

Depois de uma hora e meia, Edílson olhou pro menino que continuava sentado e falou: SEU PAI TÁ É DEMORANDO. !!!

Então o menino respondeu : Não é meu pai não senhor !
Ele é o que seu, então.? Perguntou Edílson.
Nada não senhor. Não sei quem é não.
Como é rapaz ??? Conte essa historia direito.
É que eu estava parado ali na esquina de Sêo Zuca quando ele chegou e me disse:

EI MENINO!! ‘VAMO’ ALI CORTAR O CABELO DE GRAÇA. !!!!!!

Naquela segunda feira Edílson não trabalhou mais. Botou a “doze polegadas” na cintura e passou o resto do dia procurando o tal homem que fora comprar carne.


Fernando Florêncio
(florêncio.fernando@hotmail.com)
Ilhéus/Ba (17/Dez/2008)


PS. O termo “matuto” refere-se única e tão somente às pessoas que moravam na área rural, não cabendo nenhuma conotação pejorativa.

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