quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Origem do grupo: Os Gândavos


Por Jussara Burgos

Vivíamos à Ditadura militar, que tornou obrigatória a disciplina de Educação Moral e Cívica nas escolas brasileiras. Nessa época eu dava aulas no Colégio Técnico Joaquim Pereira de Silva. Ficou acertado que nossa comemoração cívica seria uma encenação falando da Independência do Brasil. O aluno Domingos Sávio Valeriano, interpretaria Dom Pedro I, eu fiquei na coordenação e muitos outros alunos também participaram, é uma pena que não lembro o nome de cada um. 


Reunimos-nos varias vezes para definir o roteiro, o cenário, o figurino e ensaiarmos a peça. Uma aluna concluinte pediu para recitar um poema. Decidimos que ela podia se apresentar antes da peça. 

Chegou o grande dia. Sete de setembro 1974. O dono e diretor do estabelecimento, Dr. Pedro Pereira Sobrinho, convidou o pároco Herbert Henke, o médico José Agapto Moura, Gerentes dos bancos do Brasil e do extinto Bandepe e o Juiz de Direito. O auditório estava lotado. Nossa aluna que ficou com a responsabilidade de recitar, na hora H, travou e não conseguiu realizar seu intento. Isso é perfeitamente compreensível, quando a pessoa não está acostumada falar em publico. Mas o meu tio, Dr. Pedro, ficou apreensivo de que toda a programação fosse um fiasco diante dos ilustres convidados. Ele foi ate os bastidores onde eu estava reunida com o elenco, prontos para entrar em cena e chamou nossa atenção. Procurei tranqüilizá-lo dizendo: "Eu sou responsável pela peça. "

Posicionamo-nos solenemente ao som do “O Guarani” de Carlos Gomes. No primeiro momento li um texto falando da seqüência de fatos que antecederam o Grito do Ipiranga e depois era às vezes dos atores. Domingos deu um show de interpretação. Ele foi impecável. Confesso que nos ensaios ele não se saiu tão bem quanto o dia da peça. E passamos a nos reunirmos para amadurecer as idéias. O grupo precisava de um nome, tínhamos muitas sugestões e nenhuma definição. Até que Fernando José nos comunicou que folheando o dicionário havia encontrado a palavra Gândavo que quer dizer: contador de histórias. O nome foi aprovado por unanimidade. Fernando era chamado carinhosamente de Dudé, apelido da autoria de Tonho Remígio, ficou sendo o nosso diretor. Fizemos uniforme para o nosso grupo, eram macacões de mescla azul com o nome “Os Gandâvos” bordado de vermelho nas costas. Guardo o meu até hoje com carinho. 

Apresentamos-nos no Centro Lítero e Recreativo de Custódia. Depois viajamos para São Caetano e Iguaraci

Peças que encenamos: Morre um gato na China, do Pedro Bloch; Rua do lixo, 24. Do Mestre Vital Farias. 

Elenco: 
- Fernando José Carneiro de Souza. 
- Domingos Sávio do Amaral, conhecido como Domingos Valeriano, que já não está entre nós.
- Carlos Lopes, Carlim de Zé das máquinas, 
- E eu, Jussara Burgos. 




Por Fernando José
Para Jussara

A origem de Os gândavos se deu no final de 1974 com a peça “Uma noite de São João”. Uma obra adaptada pelos alunos da 4ª série do Ginásio Municipal Padre Leão, tendo como finalidade coroar com êxito o término do curso ginasial. Essa peça veio do cordel “Coco verde e melancia” que sofreu sérias modificações feitas por nós. Cada um dava uma ideia, transmudando-a em uma nova engraçada comédia. A peça foi um retumbante sucesso, leve-se em conta que na época inexistia a máquina de fazer doido (televisão). 

Aquele tempo qualquer atração fazia enorme sucesso (circo, cinema de 16 mm de Zé das Máquinas, shows de auditório de Zé Melo no C.L.R.C). Tudo isso atraía muitos expectadores. 

Insuflados por esse êxito momentâneo, resolvemos dar continuidade a atividade teatral. Aí surgindo como por acaso e de formação espontânea “Os gândavos”, termo descoberto por Domingos em uma de suas viagens psicodélicas pelas páginas do “pai dos burros” como se dizia na época (o dicionário). Em um fim de tarde inspirado, compôs com Tonho Remígio o hino dos Gândavos, cantado antes das apresentações por todo elenco do grupo teatral. Em seguida, o pano se abria e começava o primeiro ato. 

Quando da apresentação da peça “Independência do Brasil” no colégio de Dr. Pedro, o grupo já existia. A única fotografia que me restou dos Gândavos foi tirada no momento dessa encenação. Nesse postal, eu estou em cena com Domingos. Contraditoriamente eu encarno D. João VI (eu mais novo ) e Domingos representa D. Pedro I, o filho (ele mais velho). Porém tudo deu certo. Eu envelhecido pela maquiagem e por uma barriga postiça feita com muitos panos embaixo da camisa, o cabelo pintado de branco, feito por você. 




Olhando o verso desse postal, está registrada a data da encenação: 07 de setembro de 1975. Já fazia quase um ano da formação do grupo. Além da data, consta o carimbo dos Gândavos, impresso, e abaixo, a minha assinatura e a de Domingos como se prevíssemos um documento para a posteridade. 

O que mais admirava em Domingos era a sua capacidade de improvisação, como se tivesse vivido uma formação circense. Conforme você mesma lembrou, fraco nos ensaios e um gigante nas apresentações. Que Deus o tenha! 

Que belas recordações! Enquanto a peça rolava, tinha-se como fundo musical “Rosamunde” de Franz Schubert , que dava um ar de atemporalidade ao momento. Em seguida vieram outras peças, como você relembra: Rua do lixo, 24, de Vital Santos; Morre um gato na China ou Uma janela para o céu (Pedro Bloch) e outras que não consigo lembrar, pois parte dessas recordações se perdeu nas brumas do tempo, nos recôndidos mais sombrios das sinapses cerebrais. Porém algo ficou para sempre. Uma lembrança doce daqueles tempos ingênuos que jamais poderei esquecer. 

Fernando José Carneiro de Souza 
Custódia, 04 de novembro de 2011

1 comentários:

Anonymous disse...

Fernando José/Jussara.
Para aqueles que como eu saíram de Custódia nos anos 60, é muito gratificante saber, mesmo a conta-gotas, o que aconteceu de lúdico e cultural na nossa cidade durante esta nossa longa ausência.
Seria bom que a geração atual, que com certeza é e será responsável pela continuidade da nossa história, apresente "as armas", informado-nos o que teem feito.
Jussa, diante da esculhambação que está nossa educação, sou obrigado a dizer que sinto saudades da EMC (Educação Moral e Cívica) bem como da OSPB (Organização Social e Política do Brasil).
Fernando Florêncio
Ilhéus/Ba

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