sexta-feira, 13 de abril de 2012

O caminho das serras no inverno - Cristiano Jerônimo



A sequência de serras que circunda o limite do município de Custódia com os de Carnaíba, Afogados da Ingazeira e Iguaracy é um espetáculo para quem tem oportunidade de subir até seus brejos de altitude e chapadas com caldeirões de pedras repletos d’água, gelada o dia inteiro por ser coberta com pastas verdes. Para beber a água usamos a palha em forma de concha do coco catulé (também conhecido como coco-da-quaresma). A criação de cabras, como chamamos, anda pelas trilhas das serras e quando o fruto maduro do catulé cai, os bodes põem na boca e começam a remoer um caroço pequeno, mas com casca igual a de coco normal. Eles comem a carnosidade externa, amarelada e doce. Os caprinos trazem os caroços duros, na boca, até os arredores da fazenda, onde quebramos com pedras e encontramos uma amêndoa deliciosa do tamanho de um caroço de azeitona grande.

Tudo isso é sertão para mim. Estou escrevendo sobre a cadeia de montanhas e o campo porque tenho dois filhos – Victor Valeriano, 10 anos, e José Pedro Valeriano, 5, e eles pouco conhecem das entranhas daquele bioma chamado de caatinga. Entre os altos, estão as serras da Mata Grande, Minador, Leitão, Mimoso, Zabumba, Urubu, Brejinho, Travessão do Caroá, entre outras. Estava pensando como faço para levar meus filhos até lá. Cheguei a pensar em reabrir o caminho onde, um dia, vi estrada e carros subirem até o topo. Isso foi por volta de 1994, no governo de Belchior Nunes, que construiu um posto de saúde ao lado da Escola Municipal Francisco Domingues de Rezende (meu tataravô materno por parte de Vó Marina). Embora meu tio Djaniro Jerônimo de Rezende (Dejo de Odilon) fosse vereador já no quinto ou sexto mandato consecutivo pela Arena, PDS, PFL e, em oposição, Belchior era Arraesista de carteirinha, mesmo assim o prefeito socialista mandou abrir o caminho do Mimoso de baixo (sede da fazenda) até o topo da serra de mesmo nome.


Vivi minha infância andando nestas subidas e descidas de grotas e montanhas ora verdes ora secas. Saí de 7h da manhã para o Leitão da Carapuça, voltando para casa às 9h da noite. Lá, encontrei cavernas com pedras de calcita multicoloridas que, geladas, podiam ser extraídas da base, no sopé de um paredão de pedra. Acima do que chamamos de pedra do giz, tem as pinturas rupestres que meus avós e tios-avó citavam como existentes, mas não sabiam do que se tratava. Tio Tonhinho Rodrigues Rezende disse, certa vez, que eram estrangeiros. Perguntei a ele sobre o caminho. Confirmei com meu avô Odilon Jerônimo, que alertou: “Mas já faz 40 anos que não ando por lá. É melhor vocês não irem” –. Fomos e descobrimos. Soube, anos mais tarde, que tratava-se do Sítio Arqueológico da Serra da Carapuça, com pinturas datadas de cerca de 2.300 anos, de acordo com pesquisadores da UFPE.

Os momentos paradisíacos de água no sertão reacendem o tempo inteiro na minha memória. Agora mesmo a região está assim. Encharcada, verde, florida de canafístulas amarelas e flores de todas as cores. Borboletas vestidas de tonalidades fantásticas de desenhos perfeitos de simetria. A natureza em sua forma de vida mais abundante. Quitimbú (berço de Custódia) está frio. O açude de Brotas, em Afogados da Ingazeira, está sangrando, ainda neste mês de julho, desde a Semana Santa. Uma Traíra (de uns 30cm) assada na brasa está por R$ 3,00 (duas por R$ 5,00) na beira do sangradouro da parede da represa, nas corredeiras de água entre pedras. Quero levar meus filhos, meus irmãos, meus pais. Quem quiser ir, vamos embora! Uma infinidade de outros açudes, barragens, barreiros, poços estão cheios. E o sertão não virou mar. Será?

Por Cristiano Jerônimo

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